Visibilidade social
Os artistas que ocupam as ruas são quase sempre jovens, como os skatistas da rua Rio de Janeiro (no quarteirão fechado próximo à Praça Sete) e os dançarinos de break que nos anos 80 se reuniam no Edifício Sulamérica, aos domingos. Mas a pesquisadora Rita Aparecida da Conceição Ribeiro encontrou um grupo de cinquentões no trecho conhecido por Quarteirão do Soul, na rua Goitacazes, também no Centro de Belo Horizonte. Tema de sua tese de doutoramento, defendida no Instituto de Geociências da UFMG em 2008, os dançarinos veteranos são exemplo do conceito – criado pelo sociólogo espanhol Manuel Castells – de identidades de resistência, que se fundam na contramão das identidades hegemônicas. Segundo Rita Ribeiro, os blacks que se conheceram nos anos 70 seguem padrão contrário à ordem vigente, têm seus próprios ritos e se apoderaram do espaço urbano sem consultar qualquer instância de poder.
No tempo em que frequentou o local, a pesquisadora pôde observar as reações mais diversas. Viu de transeuntes surpresos e encantados pelas coreografias a olhares de censura. Nos primeiros dias, o grupo foi vítima de denúncias infundadas para a polícia. “Hoje a cidade parece incorporar com tranquilidade o movimento, e mesmo os jovens têm se aproximado, o que é muito bom, porque o movimento soul, que parecia fadado à extinção, começa a se renovar”, ela comemora. Outra boa notícia trazida pelo fenômeno da rua Goitacazes, na visão de Rita Ribeiro, é que ele aumenta as chances de preservação da cidade. “Quanto mais se apropriarem do espaço urbano, mais as pessoas se sentirão integradas a ele”, ela reforça.
Rita desenvolveu sua pesquisa influenciada por nomes como o geógrafo Milton Santos, “para quem os pobres da cidade são aqueles que fazem o urbano vibrar”, do filósofo francês Henri Lefèbvre, que pensou o urbano como um processo social, e do antropólogo e cientista político Luiz Eduardo Soares, que discute a invisibilidade social. “A resistência parte de um ponto de tensão”, explica Rita Ribeiro. “E os frequentadores do quarteirão são operários, donas de casa, trabalhadores do mercado informal que naquele espaço saem de sua invisibilidade para assumir outros papéis, com apelidos black.”
Para Luiz Eduardo Soares, se a invisibilidade é uma experiência e um produto político relevantes para um conjunto de indivíduos e grupos sociais “imprecisamente chamados vulneráveis”, serão também importantes, como respostas populares, manifestações artísticas ou estéticas, além de modalidades de integração em coletividades dotadas de identidades e pertencimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário